"Os efeitos da cláusula de inalienabilidade devem ser apreciados sob duas perspectivas, a que permite divisá-las no plano das proibições que encerra e a que os apanha quando transgredida. Dizem respeito, por outras palavras, na classificação de José Ulpiano, à extensão e à sanção. O exame da extensão da cláusula dirige-se aos atos que proíbe e às consequências virtuais que acarreta. O da sanção, às penas a que dá lugar sua infração.
O efeito substancial consiste na proibição de alienar o bem clausulado. Impedido fica o proprietário de praticar todo ato de disposição pelo qual o bem passe a pertencer a outra pessoa. Numa palavra, não pode transferi-lo voluntariamente. Está proibido, em suma, de vendê-lo, doá-lo, permutá-lo ou dá-lo em pagamento. Estende-se a proibição aos atos de alienação eventual, não lhe sendo permitido, por conseguinte, hipotecá-lo ou dá-lo em penhor. É controvertido se pode limitar sua propriedade mediante a constituição de outros direitos reais, como o usufruto, o uso e a habitação. Pela afirmativa, porque não implicam alienação. A proibição alcança somente os atos voluntários, de sorte que o proprietário do bem inalienável pode vir a perdê-lo por desapropriação. Não o perde, porém, deixando que outrem o adquira pelo usucapião, conquanto não ocorra, na hipótese, alienação. Do contrário, a proibição poderia ser frustrada mediante conluio entre o proprietário e o possuidor. Prevalece, de resto, o princípio de que o usucapião não é aplicável aos bens inalienáveis. A imprescritibilidade é, com efeito, uma das consequências virtuais da inalienabilidade, que também se produz quando determinada pela vontade particular. Outro efeito, de maior relevância, é a impenhorabilidade. Posto não seja voluntária, mas coativa, a alienação determinada pela execução de credores campearia a fraude se o bem inalienável fosse penhorável. A cláusula de inalienabilidade é oponível a todo e qualquer credor. Entre as consequências da inalienabilidade [incluem-se a incomunicabilidade e a impenhorabilidade. Entendiam alguns autores] que, estabelecida a mera inalienabilidade, não se [prescrevia] implicitamente a incomunicabilidade. O bem simplesmente inalienável [se comunicaria] ao outro cônjuge porque a comunicação não implica alienação. Ademais, importando a incomunicabilidade alteração excepcional do princípio da imutabilidade do regime matrimonial de bens, a disposição legal que permite tal cláusula tem de ser interpretada restritamente. [Pondo fim à celeuma existente, o legislador estabeleceu que a cláusula de inalienabilidade importa incomunicabilidade e impenhorabilidade do bem (art. 1.911). Essa já era a] opinião dominante, tanto na doutrina como na jurisprudência, [encontrando-se a matéria inclusive sumulada].10 Sustentavam-na com apoio no argumento principal de que o vocábulo inalienabilidade tem o amplo significado de abranger todas as formas de transferência da propriedade. A ela nos filiávamos. Outra exceção à inalienabilidade é a execução por dívida proveniente de impostos, imposta no interesse público. Permite-se, finalmente, a alienação do bem clausulado mediante sub-rogação autorizada pelo juiz, não obstante a disposição legal que proíbe a dispensa da cláusula. Assim se procede, no entanto, sob o entendimento de que não se justifica a interpretação literal, em face, inclusive, de elemento histórico da lei. Tem sido admitida até quando há expressa proibição do testador. A inalienabilidade não se estende aos frutos e rendimentos. A sanção contra a infração da proibição de alienar pode ser estipulada pelo testador sob a forma de cláusula penal de resolução da liberalidade. Quando inexiste, a infração é legalmente punida com a resolução do negócio de alienação. A inexecução da obrigação de não alienar traz como consequência a resolução do ato infringente. Atentos, porém, aos graves inconvenientes que apresenta semelhante sanção, passou-se a admitir a anulabilidade do ato. Outros acham, todavia, que deve ser fulminado com a nulidade absoluta. A opinião coaduna-se à natureza da cláusula de inalienabilidade. Se, com efeito, se trata de indisponibilidade real, o ato de disposição é nulo de pleno direito. A respectiva ação poderá ser intentada, nesse caso, por qualquer interessado, compreendidos os herdeiros do testador. É indiferente que o terceiro adquirente esteja de má-fé, ou não. A rigor, não pode alegar boa-fé, por injustificável a sua falta de diligência. Os efeitos diretos e principais da ação de nulidade são a destruição do ato de alienação e a restituição do bem ao herdeiro, ou ao legatário, para ficar sujeito ao destino que lhe foi conferido. Cabe ao terceiro adquirente reclamar do alienante a restituição do preço.
Fonte: Gomes, Orlando. Sucessões (pp. 138-139). Forense. Edição do Kindle.
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