Quando o Supremo Tribunal Federal aprovou a União Estável homoafetiva, ele se esqueceu de algo: do regime de bens.
Todo mundo usa o amor e o afeto para justificar as coisas no direito de família, mas se virou processo, a chance de ter grana no meio é alta.
Chegou no escritório a primeira cliente após essa decisão daquele que chamamos Pretório Excelso. Aparentava ser uma senhora de uns sessenta anos. Sua voz estava meio grave, pressupus que havia sido fumante a maior parte da vida. Reclamou que as brigas em seu relacionamento, que era uma União Estável de décadas, começaram após a decisão do Tribunal. Ela era de origem humilde, e sua parceira uma empresária milionária. A pressuposição sempre foi separação de bens – nem havia como fazer essa opção – mas o Supremo jogou, sem opção de escolha pelas partes, a comunhão parcial na cabeça de todo mundo que tinha uma União Homoafetiva. Por isso é importante deixar o parlamento fazer as leis ou mudar a Constituição, não delegar tudo ao STF. Essa cliente queria a parte dela, sua companheira não achava justo.
Desses casos, quem tem grana raramente abre a mão tranquilamente.
E ela foi contando a história, reclamando, especificando detalhes que eu perguntava. O ar condicionado da sala geralmente é bem frio, pois tenho que ficar de terno e gravata, e o verão de São Paulo é insuportável. A cliente não veio preparada e espirrou.
Espirro revelador. A mãozona foi ao rosto com rapidez, e o ar saiu pela boca como se fosse um aspirador de pó de alta potência na função sopro. Espirro de macho. Não aquele espirro curto e tímido de moça.
E você vai pensar que é por que ela era homossexual, vai por mim, já trabalhei para mulheres homossexuais e elas não espirram daquele modo. Eu é que não percebi estar trabalhando para um casal de transgêneros.
Minha cliente notou que eu não tinha sacado até aquele momento e deu risada. Divertimo-nos bastante, e ela ficou feliz por ter temporariamente me enganado.
Toda e qualquer similaridade dessa história com algum fato ou evento da vida real é mera coincidência.
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