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Blog de um advogado especializado em família

A Súmula 377 do STF e seus efeitos no regime da separação legal são explicados pelo advogado de família Dr. Paulo Ladeira.


"Em relação a este regime, debate-se a persistência da eficácia da Súmula 377 do STF (03.04.1964), segundo a qual “no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. O enunciado originou-se de interpretação dada pelo Tribunal ao art. 259 do diploma anterior e objetivava reduzir os rigores do regime de separação legal.67 O preceito não foi reproduzido pelo legislador de 2002, havendo dúvidas quanto à aplicabilidade da súmula após a promulgação do Código Civil. Há quem sustente a ineficácia do enunciado com base na revogação do art. 259 do Código Bevilaqua e na vigência do atual art. 1.641, circunstância que, por si só, afastaria sua aplicação. Trata-se de entendimento que encontra defensores em doutrina68 e jurisprudência. Em sentido contrário, afirma-se que, a despeito da revogação do art. 259, a Súmula 377 fundamenta-se nos princípios da solidariedade social e da proibição do enriquecimento sem causa: “Em se tratando de regime de separação de bens, os aquestos provenientes do esforço comum devem se comunicar, em exegese que se afeiçoa à evolução do pensamento jurídico e repudia o enriquecimento sem causa, estando sumulada pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula 377). Impõe-se manter o entendimento jurisprudencial do STF substanciado na Súmula 377, segundo o qual no regime de separação legal de bens comunicam-se os bens adquiridos na constância da sociedade conjugal”. Instaurou-se, então, a controvérsia para se verificar a necessidade da comprovação do esforço comum, ou seja, do engajamento de ambos para a construção do patrimônio durante a união estável, o qual pode se refletir tanto em contribuição direta para a construção do patrimônio quanto indireta, mas que revele o empenho para a construção do patrimônio no percurso conjugal. O STJ tem se manifestado (i) tanto pelo reconhecimento do esforço comum empreendido nas hipóteses de separação obrigatória, mitigando-se a presunção contida na construção sumulada (ii) quanto pela desnecessidade da prova do esforço comum para que haja a partilha de bens. Sob o prisma da primeira posição (i), a Súmula 377 do STF vem sendo revisitada pelo STJ, prevalecendo o entendimento de que a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que comprovado o esforço comum, de modo a prestigiar a eficácia do regime de separação (legal) de bens. Caberá ao interessado comprovar que teve efetiva e relevante (ainda que não financeira) participação no esforço para aquisição onerosa de determinado bem a ser partilhado com a dissolução da união (prova positiva). Por outro lado, também há posicionamentos (ii) no sentido de dispensar o esforço comum em casos de uniões duradouras e sedimentadas, em que é possível presumir a colaboração mútua do casal, mesmo que circunscrita à esfera doméstica, a partir da vida em comum. Além disso, há que se distinguir as hipóteses de separação legal enumeradas nos três incisos do art. 1.641: I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II – da pessoa maior de setenta anos; III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. Se a ratio da construção jurisprudencial traduz, inegavelmente, preocupação com a prevalência do princípio da solidariedade, há de se vincular a incidência do enunciado às hipóteses em que a imposição do regime patrimonial perdure e seja merecedora de tutela. Assim sendo, em relação aos incisos I e III, o enunciado deve prevalecer enquanto persistirem os impedimentos legais. Ou seja: o Enunciado n. 377 do STF aplica-se aos casos de pessoas que contraíram matrimônio em inobservância de causa suspensiva de celebração, ou de pessoas que dependam de suprimento judicial, enquanto se verificarem as causas estabelecidas pela lei para a aplicação do regime de separação total. Cessados os impedimentos ou incapacidades, mostra-se possível a alteração do regime de bens, tornando-se injustificada a comunicação dos aquestos. Vale dizer: superado o impedimento ou incapacidade, o regime da separação somente será mantido se expressar a vontade das partes, hipótese em que, à evidência, não se justificaria a comunicação patrimonial coativa. Em relação ao inciso II, contudo, diverso há de ser o entendimento, já que não se justifica, axiologicamente, a restrição imposta pelo dispositivo aos maiores de 70 anos, daqui resultando, por maioria de razão, a inaplicabilidade do enunciado. Na mesma linha de entendimento, como já registrado, a Súmula 377 do STF deve ser vista com ressalva, por representar, também, imposição heterônoma – nos mesmos moldes do regime de separação legal, sendo necessário integrar do ponto de vista interpretativo, no respeito à autonomia privada, o regime de bens e a sucessão hereditária."


Fonte: Tepedino, Gustavo; Teixeira, Ana Carolina Brochado. Fundamentos do Direito Civil - Direito de Família - Vol. 6 (pp. 196-198). Forense. Edição do Kindle.


Dr. Paulo Ladeira é advogado especialista em direito da família e sucessões - ou seja, advogado familiar - com atuação em São Paulo e São José dos Campos, formado na Universidade de São Paulo (USP), campus Largo São Francisco.

Casamento contraído quando pelo menos um dos nubentes é maior de 70 anos explicado por um advogado familiar.


"Essa disposição não se justifica, em face da incoerência axiológica da restrição imposta pelo dispositivo aos maiores de 70 anos. De fato, o dispositivo legal estabelece injustificada restrição à liberdade pessoal do septuagenário, submetendo-o a verdadeira interdição compulsória, como se ele não tivesse capacidade para escolher os rumos patrimoniais da sua relação amorosa, em desapreço ao princípio da igualdade positivado no art. 5º, caput, da Carta Constitucional. Daí a crítica veemente da doutrina desde a promulgação do Código Civil. Quando da entrada em vigor do Código Civil, a idade era de 60 anos. Diante das objeções antepostas ao art. 1.641, II, do Código Civil, o legislador alterou o dispositivo, elevando para 70 anos a idade para o regime de separação obrigatória, por meio da Lei 12.344/2010. Não se afastou, contudo, a suspeita de inconstitucionalidade do preceito, mantendo-se a injustificada restrição à liberdade existencial dos idosos. De fato, como já se disse no capítulo 1, no âmbito da família, a imposição de regras heterônomas faz sentido quanto há alguma vulnerabilidade, de modo que a solidariedade familiar reclama a intervenção estatal reequilibradora. Não parece ser esse o caso. A tentativa, entretanto, por parte do Judiciário, mediante nova intervenção heterônoma, de contornar a restrição à liberdade contratual do idoso, acabou por agravar o problema, com a Súmula 377 do STF, que determina a comunicação de aquestos no âmbito do regime de separação legal. Vale dizer, há que se afastar a injustificada restrição ao regime obrigatório da separação imposta ao idoso, para que ele possa pactuar diversamente, desde que, ao mesmo tempo, se admita a validade e eficácia dos pactos antenupciais que estabeleçam a separação de bens. Mostra-se incompleta, portanto, a crítica, dirigida à dicção do art. 1.641, II, Código Civil, sem que se proponha, ao mesmo tempo, a legitimidade do regime de separação convencional entre os idosos, com o afastamento da Súmula 377, especialmente diante do sistema sucessório atual, que impõe a sucessão entre os cônjuges, em concorrência com os descendentes, mesmo no regime de separação convencional de bens (art. 1.829, I). Tal regime sucessório impede a liberdade entre idosos para a construção de relação conjugal que possa atenuar (e não aguçar) tensões patrimoniais suscitadas pelo potencial concurso sucessório com descendentes provenientes de relacionamentos anteriores de cada um dos cônjuges. Sobre o tema, ainda na vigência do Código Civil de 1916, destaque-se o entendimento jurisprudencial capitaneado pelo então Desembargador Cezar Peluso, no sentido da perda de validade do preceito com o advento da Constituição de 1988: “o disposto no art. 258, parágrafo único, II, do Código Civil, refletindo concepções apenas inteligíveis no quadro de referências sociais doutra época, não foi recepcionado, quando menos, pela atual Constituição da República, e, portanto, já não vigendo, não incide nos fatos da causa. É que seu sentido emergente, o de que varão sexagenário e mulher quinquagenária não têm liberdade jurídica para dispor acerca do patrimônio mediante escolha do regime matrimonial de bens, descansa num pressuposto extrajurídico óbvio, de todo em todo incompatível com as representações dominantes da pessoa humana e com as consequentes exigências éticas de respeito à sua dignidade, à medida que, por via de autêntica ficção jurídico-normativa, os reputa a ambos, homem e mulher, na situação típica de matrimônio, com base em critério arbitrário e indução falsa, absolutamente incapazes para definirem relações patrimoniais do seu estado de família”."


Fonte: Tepedino, Gustavo; Teixeira, Ana Carolina Brochado. Fundamentos do Direito Civil - Direito de Família - Vol. 6 (pp. 193-195). Forense. Edição do Kindle.

"Diante da relevância de certos negócios jurídicos na vida econômica do casal, estabelece o Código Civil restrições ao poder de administração e disposição dos cônjuges, mediante a exigência da outorga uxória (da mulher) ou marital (do marido) para a sua celebração. Trata-se de limitação à autonomia privada dos cônjuges devido ao risco de que alguns atos, praticados por apenas um deles, acarretem a diminuição do patrimônio da sociedade conjugal, ou mesmo do patrimônio particular do outro consorte. Considera-se que a outorga pode ser conferida antes da celebração do negócio jurídico ou no mesmo ato; quando posterior, terá a natureza de confirmação ou ratificação, considerando-se anulável o ato desprovido de autorização conjugal. Prevê o Código Civil, no art. 1.647, rol taxativo de atos que não podem ser praticados por qualquer dos cônjuges sem a autorização do outro. Afastam-se da incidência do dispositivo os cônjuges casados pelo regime da separação absoluta de bens, pela própria dicção legal. A doutrina controverte quanto ao alcance do termo “separação absoluta”, vale dizer, se relacionado tão somente aos casos de separação obrigatória, ou se também se estenderia ao regime da separação convencional. Autorizada doutrina sustenta que a expressão abrangeria ambos os casos, o que parece refletir a finalidade pretendida pelo legislador. Em sentido contrário, afirma-se que apenas a separação convencional pode ser reputada “absoluta”, pois, no caso da obrigatória, existe o risco de comunicabilidade por força da Súmula 377 do STF – a sugerir a indispensabilidade da outorga conjugal. Sustenta-se, nessa direção, que a separação absoluta se encontra circunscrita à separação convencional de bens, não sendo razoável a exigência de autorização do cônjuge para dispor de bens, ou gravá-los, quando o próprio casal optou pelo regime da separação total. Entre os atos cuja prática é vedada sem a devida vênia conjugal, encontram-se quaisquer atos que sirvam de título à transferência de domínio dos bens imóveis. De fato, os atos de disposição sobre imóveis não constituem atividades ordinárias de administração da sociedade conjugal, não se justificando, por isso, que possam ser praticados por um só de seus membros. Exige-se, ainda, a autorização do cônjuge para ser parte em ações que versem sobre direitos reais. Não há forma especial para a exteriorização de tal autorização, podendo ser realizada na petição inicial ou em documento específico. Não se trata de litisconsórcio ativo necessário, e sim facultativo, pois o cônjuge que dá a autorização não é obrigado a ser parte no processo. Por outro lado, a disciplina do Código Civil deve ser interpretada em observância ao ditame do art. 73, § 1º, I, do CPC,53 a indicar a formação de litisconsórcio necessário entre os cônjuges caso figurem como réus na ação.54 Nesse sentido, o STJ debateu se era condição de validade do negócio a outorga em contrato de arrendamento rural: entenderam que se trata de pacto não solene, sem formalismo para sua existência, razão pela qual é desnecessária a outorga conjugal, além do que não está contido nos atos previstos no rol do art. 1.647 do Código Civil. Também é necessária a vênia conjugal para a concessão de fiança ou aval. O Código Civil de 1916 reconhecia a possibilidade de o cônjuge prestar fiança sem autorização de seu consorte, nada dispondo sobre a outorga de aval.56 O Código Civil em vigor, por sua vez, equiparou o aval à fiança no que tange à necessidade da autorização marital ou da outorga uxória. O Enunciado 114 da I Jornada de Direito Civil, contudo, prevê que “o aval não pode ser anulado por falta de vênia conjugal, de modo que o inc. III do art. 1.647 apenas caracteriza a inoponibilidade do título ao cônjuge que não assentiu”. Em interpretação restritiva, o STJ tem entendido que a aplicação da regra limita-se aos “avais prestados aos títulos inominados regrados pelo Código Civil, excluindo-se os títulos nominados regidos por leis especiais”. Assim também entende o Superior Tribunal de Justiça, conforme registrado na Súmula 332, segundo a qual “a fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia”. Exige-se ainda autorização do cônjuge para doações tanto de bens móveis quanto de imóveis. Por se tratar de sociedade conjugal, cujos bens que a integram são comuns ao casal, torna-se inadmissível permitir que o cônjuge, sem anuência do outro, se desfaça do patrimônio comum por simples liberalidade. Não se proíbe, porém, a chamada doação remuneratória e, ainda, as doações nupciais feitas por apenas um dos cônjuges aos filhos quando casarem, ou quando estabelecerem economia separada, a exemplo da criação de uma empresa. A permissão, porém, pressupõe que tais doações tenham por objeto bens móveis, já que, na hipótese de bens imóveis, resta mantida a proibição de alienação dos mesmos sem outorga uxória. O tema da outorga torna-se complexo no mundo contemporâneo, com novos bens cujo valor passa a ser igual ou maior do que aquele dos bens que, antes, eram tidos como os de maior valor, como os imóveis, por exemplo. Se a ratio da outorga conjugal é a proteção ao patrimônio do casal, sites e moedas digitais dão novos contornos ao patrimônio e desafiam sua adequada proteção no âmbito da família."


Tepedino, Gustavo; Teixeira, Ana Carolina Brochado. Fundamentos do Direito Civil - Direito de Família - Vol. 6 (pp. 189-192). Forense. Edição do Kindle.


A solução no seu caso concreto pode ser diferente. Contrate uma consulta com o Dr. Paulo Ladeira, advogado especialista em direito da família e sucessões - ou seja, advogado familiar - com atuação em São Paulo e São José dos Campos, formado na Universidade de São Paulo (USP) para esclarecer detalhes ou divergências nos entendimentos dos magistrados.

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